Jornal A Semana

A CONTEMPORANEIDADE DE UM CRIME SECULAR

  • Douglas Varela
  • 20/06/2020 09:15
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De tempos em temos acontecimentos lembram-nos de problemáticas que estão em frente aos nossos narizes e negamos ver. A pandemia do Covid-19 trouxe à tona aspectos que durante a correria cotidiana geralmente não dávamos atenção, a exemplo da importância do contato social, do afeto, da educação e de políticas públicas voltadas às necessidades humanas básicas. Tal qual a pandemia, o assassinato do americano George Floyd comoveu o mundo e fez-nos pensar sobre um problema histórico e social negado por muitos, porém ainda vividamente presente na contemporaneidade.

Ao ler as notícias sobre manifestos e assistir ao vídeo do assassinato lembrei-me de uma obra que li há dois anos atrás, denominada “O Sol é Para Todos”, vencedor do Prêmio Pulitzer e um clássico da literatura americana, escrito por Herper Lee.

A trama é narrada por uma criança, a filha do advogado Atticus que trabalhava no caso de um negro americano, Tom Robinson acusado injustamente de estuprar uma mulher branca.

Apesar de o livro ter sido publicado em 1960, suas palavras ainda se fazem atuais. Um trecho dito pelo advogado durante o julgamento diz o seguinte: “O que, meus senhores, sabemos ser, é por si, uma mentira tão negra quanto a pele de Tom Robinson, uma mentira que não preciso realçar. Vós conheceis a verdade e a verdade é esta: alguns negros mentem, alguns negros são imorais e não podemos confiar em alguns negros perto de nossas mulheres, quer brancas quer negras. Mas esta é uma verdade que se aplica à raça humana e não a qualquer raça de homem em particular. Não há uma única pessoa nesta sala que nunca tenha mentido, que nunca tenha feito algo de imoral, e não há um único homem vivo que nunca tenha olhado com desejo para uma mulher”.

A genial narrativa traz em pauta a necessidade humana histórica de transferir a culpa a alguém para justificar atos. A ocupação Imperialista do continente africano foi justificada como uma missão na qual as nações desenvolvidas levaram “um modo de vida civilizado” para os locais “atrasados” e “selvagens”. Quando colonizadores vieram explorar as riquezas da América diziam que estavam salvando as almas indígenas. Os navios negreiros carregavam a resposta de que a raça negra era “inferior” e estava tudo bem usurpar.

E assim como o caso de Tom Robinson e de George Floyd, pessoas historicamente utilizam o poder monetário e social para explorar e dar justificativas ao injustificável.

Pergunto-me até quando continuaremos a repetir os erros de nossos antepassados e a tornar um preconceito secular, ainda atual.

 

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